Entrevistámos Gonçalo Barral, diretor geral da Essilor Portugal, que expressou as estratégias, preocupações e previsões agora que o estado de emergência acabou em Portugal e um novo período se avizinha para o setor da ótica.
(À data desta entrevista desconheciam-se ainda as medidas aplicadas para o desconfinamento.)
Durante este período inesperado de confinamento, quais foram as medidas internas e quais os planos de contingência ativados pela Essilor?
Desde cedo, ainda em fevereiro, quando não havia qualquer caso em Portugal, e perante o que estava a acontecer noutros países da Europa, ativámos imediatamente o nível de alerta 1, o que já não acontecia há muitos anos na Essilor. Fizemos desde logo uma comunicação aos nossos colaboradores sobre os riscos e as boas práticas a ter neste período que se aproximava, proibimos imediatamente viagens internacionais, limitámos quase a zero as visitas à Essilor, quer pela parte de formação, quer pela parte de fornecedores, incluindo alguns clientes, entre outros, para ter mais controlo sobre as condições de segurança das nossas pessoas e depois cancelamos congressos, feiras, convenções, formações e até os nossos rastreios, que são uma atividade que desenvolvemos com frequência.
Quando em Portugal apareceu o primeiro caso, no início de março, logo aí subimos imediatamente para o nível de alerta 2, o que fez com que, aí sim, tivéssemos um cuidado redobrado com os grupos de risco, que imediatamente foram retirados das instalações, sempre em estrito contacto e através da nossa médica da medicina do trabalho. Foi a nossa médica que chamava as pessoas dos grupos de risco, muitos deles nem sabíamos que eram grupos de risco, e foram conduzidos para o teletrabalho ou ficando em casa, se não fosse possível, mantendo as mesmas condições. Fizemos logo kits de proteção para as nossas pessoas com máscaras, gel desinfetante, entre outros itens essenciais. Reduzimos ainda mais o número de presenças no edifício, ficando em teletrabalho quem pudesse ficar. Quem permaneceu, mais na parte de operações, teve que absorver uma série de procedimentos de segurança, quer à entrada, quer à saída e ainda durante o tempo de trabalho. Também limitámos as visitas da nossa rede comercial a clientes para proteger os clientes e todos nós. Afinal somos potenciais “contagiadores” e potenciais contagiados Interessa ter isso em consideração e reduzimos de imediato os contactos ao mínimo possível. Até hoje temos 0 casos de covid-19 positivo, apesar de não depender só de nós, estamos satisfeitos com as medidas implementadas e não registamos nenhum doente.
De que maneira estão a pensar apoiar os óticos durante este período, aliás durante o período que passou, com as óticas as abrirem só para situações de emergência e serviços pontuais, e de que forma o vão fazer nesta fase que iremos começar segunda feira?
Ainda estamos a ver o que sai da reunião de ministros amanhã e depois do parlamente, mas de qualquer maneira, o apoio aos óticos, como sempre, o mais importante é que estamos aqui e sempre estivemos aqui e vamos continuar. Ou seja, através das equipas comerciais que nunca deixaram de estar ativas, mesmo com uma drástica e abrupta redução do volume de negócios continuaram a trabalhar, e também a equipa de customer service está ativa, que tivemos que remodelar o seu funcionamento porque tiveram que começar o teletrabalho e não estávamos há dois meses a pensar que isto seria assim, e estão, ambas as equipas totalmente disponíveis para os óticos. Em segundo lugar, as nossas operações em Portugal continuam abertas. Temos o nosso laboratório de Rio de Mouro a funcionar e, com isto, temos aquela proximidade que é preciso para a ótica no seu dia a dia. Durante esta fase ainda, lançamos imediatamente quando o confinamento começou com o primeiro estado de emergência, uma série de webinars para os nossos óticos. Em primeiro lugar e logo de entrada, um webinar com o apoio de um gabinete jurídico especializado quer em direito do trabalho, quer em direito fiscal e financeiro, para os óticos esclarecerem dúvidas e saberem melhor como enfrentarem todas as questões que estavam para vir, nomeadamente benefícios fiscais, o lay off simplificado lançados pelo governo e ainda as linhas de crédito da banca lançadas na altura e que agora já foram ampliadas. Tudo isto, foram webinars que nós, em conjunto com o nosso departamento jurídico externo, organizámos para os nossos óticos, os nossos Vision Leaders. A seguir lançámos uma série de webinars mais do foro técnico-comercial para a formação de equipas, formação de óticos, porque nesta fase é importante aproveitarmos o tempo para nos formarmos e melhorarmos os nossos conhecimentos. Neste momento estão em prática uma série de webinars e vão continuar a estar. Uma das coisas positivas deste crise foi a digitalização e a aproximação por essa via, como a que estamos aqui a ter, das pessoas, e que não há afastamento social, mas sim físico e aproveitarmos estas plataformas de webinars para nos mantermos próximos e transmitir conceitos que vão ficar para o futuro para os óticos.
Entretanto soubemos de um movimento que se está a criar e no qual a Essilor tem um papel. Que significado tem esta Visão Partilhada para a Essilor e de que forma vão apoiar a ANO neste desafio?
A importância para a Essilor é a mesma que para qualquer outro player do mercado, seja da parte do retalho seja da parte da indústria. Estamos todos no mesmo barco e esta é uma mensagem que achámos que é importantíssima entender. Todo o setor da ótica está exatamente no mesmo barco, porque com esta redução drástica da procura , a grande cadeia de valor que é a ótica, aquele ecossistema relativamente, eu diria, quase fechado está a ser afetado na totalidade. Este movimento liderado pela ANO e ao qual as muitas das empresas da indústria apoiaram, tal como a Essilor, e não só das lentes oftálmicas, doutras áreas também, das armações, das lentes de contacto, entre outros. Foi um grande movimento de apoio à ANO que visa encontrar soluções para nesta fase e no futuro melhorar rapidamente a situação atual, ou melhor, sabermos ultrapassar esta crise. Temos que ter em atenção que o retalho da ótica é muito especializado, que envolve grandes níveis de investimento e neste momento, e bem, o governo considerou a ótica como serviço essencial e nós concordámos e, por isso, muitas óticas mantiveram-se abertas. Com isto temos que pensar que os custos estão lá, os proveitos, obviamente, não estão, porque o negócio diminuiu muito por falta de visitas dos consumidores e isto afeta todos. Temos que ter a consciência de que juntos somos mais forte e este movimento liderado pela ANO que, como disse, teve muito apoio por parte da indústria, sendo que nós somos mais um. Estamos com fé que vamos ter resultados muito positivos por parte deste movimento.
Como é que vê o nosso setor no período pós-covid.
Não temos uma bola de cristal nem gostamos de futurologia, mas eu diria que existem algumas tendências que se vêm claramente a surgir. Para resumir, a ótica vai sentir sobretudo três efeitos. O primeiro é o efeito ainda maior da especialização. Vai haver aqui um certo back to basics, porque as pessoas vão querer centrar-se no essencial, na nossa origem, na nossa razão de existir, no nosso fundamento e menos no acessório. As pessoas vão querer ir às óticas por razões de saúde visual e este é o forte das óticas. Aliás, surgiram com o função de proporcionar serviço de saúde visual e sabem fazê-lo muito bem e, portanto, os consumidores entendem bem esta mensagem e vão às óticas neste sentido. É óbvio que, estes serviços vão ter que passar por uma fase, sobretudo no início, de uma garantia de segurança e de saúde pública muito superior ao que se passava até agora. As óticas vão ter que estar muito atentas e servir os seus clientes com protocolos de segurança e proteção que abranjam tanto as pessoas que estão na loja como os consumidores que os visitam. Ou seja, vamos voltar ao básico, sim, mas com soluções de segurança muito superiores. O segundo ponto que diria e, de acordo com aquilo que estamos aqui a fazer, é o aumento da digitalização, dos meios digitais ou virtuais na ótica. Com a necessidade de marcações mais constantes, com a necessidade de voltar a comunicar os serviços da ótica e a respetiva importância, esta forma de operar e comunicar digitalmente vai ser fundamental. As óticas vão todas aumentar o contacto com os seus clientes através destes meios e já estão e estamos a melhorar as nossas capacidades neste âmbito. É uma tendência clara. Por último e não menos importante, vai haver aqui uma segmentação. Cada vez mais temos que nos preocupar enquanto setor da ótica com este ponto. É evidente que vai continuar a haver uma procura pelo mercado de valor acrescentado, até porque todas estas questões com a segurança vão ter custos e vão ser valorizadas pelo cliente, incluindo o serviço e produtos de excelência e vai haver clientes com capacidade para fazer face a esse custo. Mas não podemos esquecer que vai haver situações complicadas em Portugal, social e economicamente falando. O desemprego vai aumentar e o que as óticas não querem é que os seus clientes deixem de recorrer aos seus serviços, porque pensam que são mais caros. Tem que haver este cuidado na ótica, nesta segmentação e perceber cliente que temos à frente e de que maneira o vamos servir e adaptar os nossos produtos às respetivas necessidades e capacidades.